terça-feira, 26 de abril de 2011

Não é história de pescador...

Há exatos 40 anos!
do Blog do Juca Kfouri

A Justiça Divina se fez em dez letras no Morumbi*

Corria o ano de 1971.

Era abril e fazia frio no Morumbi, uma tarde de chumbo, cinzenta, daquelas em que nada pode dar certo no dia 25.

Para piorar, o Corinthians vinha mal no campeonato paulista e enfrentaria o Palmeiras de Leão, Luís Pereira, Dudu, Ademir da Guia, César, uma verdadeira seleção.

A Fiel foi ao Morumbi mais por solidariedade que por outro sentimento qualquer.

Já que a catástrofe era inevitável, afundássemos todos juntos.

O primeiro tempo não ia nem pela metade, e César já havia feito 2 a 0.

O primeiro gol aos 27 segundos de jogo, um dos três mais rápidos na história dos gols sofridos pelo Timão.

A goleada era inevitável e só não estava desenhada em cores mais fortes porque o Palmeiras preferiu brincar, dar olé, para delírio dos verdes.

A massa alvinegra, que chegara desconfiada, resolveu que uma goleada era até admissível, mas que não veria calada o seu time ser desmoralizado.

E tratou de recepcioná-lo com comovente ardor na volta para o segundo tempo.

Mesmo que aos trancos e barrancos, o time soube corresponder ao carinho, e o centroavante Mirandinha diminuiu o placar.

O Palmeiras tratou de jogar sério.

Só que, de repente, não mais, o menino Adãozinho, revelação dos juvenis que acabara de entrar, acerta um tirambaço de mais de quarenta metros que Leão não pde defender.

O Morumbi enlouquece, e a tarde fria chega a mais de cinqüenta graus.

Para gelar em seguida.

Na saída do gol de empate, o ataque palmeirense tabela até que Leivinha faz 3 a 2. O empate era só para dar o gostinho de que era possível um milagre, pensou o mais otimista dos corintianos. E nem ele tinha visto nada, ainda.

O Corinthians dá a nova saída e recua a bola para o volante Tião, um médio alto, frio, quase um estilista, mas que, definitivamente, não era de fazer gols.

Pois Tião pega aquela bola e vai.

Alguém pede na direita, ele finge que vai passar e vai.

Agora, o pedido vem do meio, ele olha como se fosse lançar e… vai.

Da esquerda sai quase uma ordem, só que Tião não ouve e vai.

Vai parar, acredite se quiser (veja o vídeo abaixo que prova, ainda em preto-e-branco, que é melhor**), vai parar dentro do gol de Leão, com bola e tudo. Uma loucura!


Três gols em menos de um minuto e meio, incluído aí o tempo para as devidas comemorações.

[…] Àquela altura, por todas as circunstâncias, o empate não seria um desastre para o Palmeiras e deveria ter sabor de vitória para o Corinthians.

Só que o jogo não estava para condicionais.

“Seria”, “deveria”, isto é coisa de jornalistas.

A única condição que todos aceitavam era ganhar.

Estava escrito para ser assim, e assim foi.

No ultimíssimo minuto, é claro.

M-i-r-a-n-d-i-n-h-a, eis, pausadamente, alto e bom som, o nome da Justiça Divina, do redentor dos humilhados. M-i-r-a-n-d-i-n-h-a fez 4 a 3, e Deus apitou o fim da partida.

*(Extraído do livro Corinthians, paixão e glória, de Juca Kfouri. São Paulo, dba, 2002; 2a edição.)

 **editado pelo Blog do Vico.

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